quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

Shoppings estão em estado de alerta

A intenção é evitar que as invasões e agitações provoquem tumultos e incômodos para os consumidores
No Shopping Interlagos, na Capital, policiais militares tentam conter tumulto - AE


     Giuliano Bonamim
giuliano.bonamim@jcruzeiro.com.br 

As administrações dos shoppings centers de Sorocaba estão atentas com os "rolezinhos". O termo designa um encontro de dezenas de jovens nesses centros comerciais, a maior parte deles moradores de áreas periféricas da cidade. A atividade surgiu em São Paulo e geralmente a convocação dos participantes ocorre em páginas criadas no Facebook. 

O Pátio Cianê Shopping, em nota, diz ter sido concebido como um espaço democrático, que valoriza a história e cultura local e confirma a adoção de medidas de segurança preventivas. A ideia é "evitar atos de imprudência e incômodo aos frequentadores". 

O estabelecimento, situado ao lado do Terminal Santo Antônio, foi questionado sobre quais são essas medidas preventivas e se o shopping pretende entrar com uma liminar na Justiça para impedir o "rolezinho" no local. A assessoria de imprensa do Pátio Cianê respondeu que, "por questão de segurança, não será possível atender a solicitação". 

No dia 27 de dezembro ocorreu uma briga no shopping. A empresária Rosália Fragetti, 35 anos, estava no local e presenciou o confronto que envolveu aproximadamente 30 jovens. "O tumulto começou muito rápido. Fiquei com o pé machucado e a minha filha de três anos levou uma cotovelada no rosto. Só deu tempo de pegá-la no colo e sair correndo", diz. Ela não soube informar se a confusão fez parte dos chamados "rolezinhos". 

O Shopping Cidade Sorocaba, situado na zona norte, comenta por meio da assessoria de imprensa que "não foi palco de ações do gênero". Na época, por conta desses eventos, ocorridos em diferentes partes do país, como medida preventiva, o complexo reforçou a segurança, principalmente aos finais de semana. 

O estudante Stephen (ele preferiu não fornecer o sobrenome), 14, diz ter sido abordado em 5 de janeiro por seguranças na entrada do Shopping Cidade Sorocaba. "Eles me pediram a carteira de identidade. Falaram que a administração do local solicitava o documento por medida de segurança", conta. 

Na ocasião, Stephen foi ao shopping para comprar um livro. "Sorte que eu estava com o RG, senão teria perdido a viagem", diz. Ele usava uma camiseta preta da banda de country rock californiana Creedence Clearwater Revival. "Não vi eles barrarem outras pessoas, mas uns dias depois eu voltei e ninguém me pediu o documento", relata Stephen. 

A gerente administrativa do Villàggio Shopping, Valéria de Almeida, diz que o local ainda não teve problemas relacionados com os "rolezinhos". "Mas estamos atentos, pois o intuito de qualquer shopping não é impedir a presença de pessoas. A preocupação é preservar quem está dentro do shopping para se divertir, comer e consumir." 

Já o Shopping Center Iguatemi Esplanada, em nota, comenta "ter como procedimento padrão atuar para garantir a segurança e a tranquilidade de seus clientes, lojistas e colaboradores visando conforto nas compras, lazer, cultura e entretenimento". No Facebook é possível encontrar uma página de convocação para um "rolezinho", mas que não ocorreu em 29 de dezembro do ano passado. O texto, na íntegra e sem correções gramaticais, diz: "Ultimo rolezinho de 2013? vamo q vamo 28/ 29, e para tirar mts com amigos e amigas i pá ! vamos tumultuar esperamos geral na entrada principal do esplanada e vamos andar até o o estacionamento iguatemi, bora? vou encostar cm nargule e pode leva". 

Novos "rolezinhos" em Sorocaba também estão agendados nas mídias sociais. Um deles pode ocorrer no Villàggio Shopping, no próximo sábado. Até ontem, 82 pessoas haviam confirmado presença. 

Especialistas falam sobre o fenômeno 

Os shoppings centers não podem rejeitar a entrada de pessoas em suas dependências. A informação é do presidente da Comissão de Direitos Infantojuvenis da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Estado de São Paulo, Ricardo Cabezón, baseada na Lei de Economia Popular de 1951, que define esses locais como espaços privados com função social de utilidade pública. 

Segundo Cabezón, os proprietários dos shoppings não podem preterir ou preferir freguês. "Essa previsão estava na Lei de Economia Popular, ainda está em vigor e é ratificada pela legislação que trata dos crimes contra as relações de consumo", conta. 

Na opinião de Cabezón, a questão dos "rolezinhos" não é muito simples. "É uma questão comportamental. O jovem gosta de aventura. Para ele, se a turma vai se reunir em algum lugar, curtir outras pessoas, melhor ainda." 

Para o advogado, nesses movimentos, como em qualquer outra aglomeração, sempre têm pessoas de boa e má índole. "Não quer dizer que o "rolezinho" é criminoso. É um movimento onde se cometem excessos e se praticam coisas que sozinha a pessoa não faria", diz. 

Cabezón diz que o Estado precisa oferecer lugares para as pessoas terem esses encontros. "Mas não basta abrir em um canto da periferia. O jovem quer um lugar agradável, que acolha essas pessoas", relata. 

Outro ponto citado pelo advogado é a questão da segurança. "Temos o direito de ir e vir, de manifestação do nosso pensamento, mas esses nossos direitos não podem afrontar os dos outros. Quando eu entro em um shopping e só penso em mim, ouvindo música em alto volume ou causando um tumulto, estou perturbando a ordem pública", completa. 

O promotor da Infância e Juventude de Sorocaba, Antônio Domingues Farto Neto, diz que o que regulamenta o acesso de crianças e adolescentes em locais públicos é uma portaria da Vara da Infância e da Juventude. "Eu quero crer que não haja essa restrição aos shoppings centers e acho muito difícil a concessão de uma liminar pela Vara da Infância e da Juventude restringindo esse acesso com a obrigação de os jovens estarem acompanhados de seus responsáveis", conta. 

O que incumbe a Vara da Infância e da Juventude é proteger as crianças e adolescentes para que ela não vá em um espetáculo público que comprometa a sua formação moral. "Agora, como dizer que um shopping center é um lugar impróprio para o adolescente? Isso não se confunde com a prática do ato infracional. O adolescente que depredar algum lugar, pichar, estragar uma área pública ou privada, pode responder pelo ato infracional. Essa restrição infracional existe independente da portaria do juiz", completa Farto Neto. 

Já o pesquisador Rafael Alcadipani, professor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas, acrescenta que os participantes dos chamados "rolezinhos" geralmente são jovens das periferias das cidades. "Percebo que é um movimento um pouco político para tentar mostrar a falta de acesso a bens de consumo e culturais", conta. 

Alcadipani relata que esses jovens também buscam uma forma de se expressar em um um ambiente onde não costumam ter acesso. "Percebo um momento de ascensão social no país novamente. Isso tem sido bem nítido com os "rolezinhos"", diz. (G.B.) 

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