Depois de ficar um bom tempo aguentando desaforos em centrais de telemarketing, Maria Telma Pereira, uma alagoana radicada em São Paulo desde 2000, decidiu buscar uma profissão mais estável e com salário um pouco melhor. Aos 27 anos, ela trocou os head phones pelo radiocomunicador. A virada começou em julho, quando concluiu um treinamento para se tornar vigilante. Ela aprendeu a se defender em combate corpo a corpo e a manusear diversos tipos de pistola — fez até um curso avançado para calibrar a pontaria. Direto da sala de aula, foi contratada para o posto de segurança em uma empresa de cosméticos, onde é responsável pelo controle de circulação dos funcionários. Uma de suas tarefas consiste em revistar todos os que entram e saem do prédio, tanto homens quanto mulheres. A aparência delicada é motivo de cantadas discretas, mas não a impede de impor sua autoridade na hora de vasculhar objetos pessoais. “Nos meus primeiros dias eu não conhecia ninguém e enquadrava até os donos da empresa”, lembra. Para fugir das situações mais tensas, tem uma estratégia pronta. “Um pedido gentil, seguido de um sorriso, desarma qualquer resistência”, conta.
Aos poucos, profissionais como Maria Telma estão se tornando menos raras na capital. O mercado de vigilância privada por aqui já conta com um efetivo de aproximadamente 30 000 mulheres, ou 17% do total. Embora ainda representem uma minoria na área, elas estão avançando rápido. Entre 2009 e 2013, o número de contratações aumentou mais de 140%. Especializada no atendimento a condomínios, a Haganá Segurança emprega 600 mulheres em seu quadro de funcionários, o equivalente a 10% do efetivo. “Todos os nossos clientes compreendem hoje o papel essencial que elas desempenham”, conta o diretor operacional, Ricardo Napoli.
 Rosi Moraes e Catia Rodrigues:normas seguidasà risca
Rosi Moraes e Catia Rodrigues:normas seguidasà risca
 
(Foto: 
Fernando Moraes
)









A crescente procura pelo perfil feminino se deve ao interesse das empresas por uma abordagem mais suave em situações em que o contato com o público é direto, como em portas giratórias de bancos e na portaria de condomínios e prédios comerciais. Além disso, esses lugares recebem um grande afluxo de mulheres, o que exige a presença de agentes femininas para possibilitar eventuais abordagens. “No dia a dia de trabalho, a presença das moças suaviza o aspecto ostensivo das escoltas e diminui constrangimentos”, explica João Palhuca, vice-presidente do Sindicato das Empresas de Segurança Privada do Estado de São Paulo (Sesvesp). O salário mensal (a partir de 1 080 reais), sem exigência de diploma universitário nem de experiência na área, também ajuda a atrair candidatas.
Os cursos de preparação duram cerca de 200 horas. Nas aulas, ministradas ao longo de um mês, as calouras aprendem defesa pessoal, técnicas de interrogatório e manuseio de armas, entre outras coisas. Nos cálculos de Renato Souza, gerente-geral da Provig, divisão de treinamentos do Grupo Protege, elas representam hoje um terço das turmas de aprendizes. “Em geral, são melhores estudantes do que eles”, completa.
Outro fator importante que estimula o ingresso feminino no setor é o sistema de trabalho, com doze horas de plantão seguidas por 36 de folga. A escala flexível permite que elas acumulem as funções de mãe e esposa. “Levamos para casa a mesma disciplina que aplicamos no trabalho”, conta Rosi Moraes, que alterna a vigilância do perímetro de um centro de distribuição em Alphaville com a colega Catia Rodrigues e outras três funcionárias.
 Monica Nogueira,durante treinamento:“No dia a dia nãoexiste sexo frágil”
Monica Nogueira,durante treinamento:“No dia a dia nãoexiste sexo frágil”
 
(Foto:
Fernando Moraes
)










As pioneiras nesse mercado estão animadas com as mudanças ocorridas nos últimos tempos. “Nos primeiros anos de carreira, estranhavam minha presença na rua”, diz a agente Monica Nogueira, de 47 anos. Com uma década de experiência, ela faz parte de uma equipe de segurança patrimonial ao lado de dois homens. Uma de suas especialidades é a vigilância armada. Monica afirma que para não ser tratada como sexo frágil nas ruas é necessário investir em aperfeiçoamento. “Quanto mais conhecimento na área, mais efetiva é a ação no campo”, afirma ela, que acaba de concluir um curso de reciclagem. Antes de se tornar vigia, atuava como enfermeira. Hoje, carrega no coldre um Taurus 38, que nunca precisou disparar. Em 2005, passou por apuros quando foi rendida por bandidos durante um assalto ao banco onde estava a postos. Felizmente, nada de pior aconteceu.
PELOTÃO FEMININO
A participação delas em alguns postos de trabalho da cidade
40% - agências bancárias
35% - shoppings
30% - condomínios
20% - indústrias